25 janeiro, 2010

Soneto a Eros e Psiquê


Num aparte da nossa oração conjugada
nossos verbos tocaram um acorde infinito
nosso eco rompeu viscerais madrugadas
nossas partes fundidas num coito balido

Foste o grito em meu ventre há muito perdido
Fui teu ego acalmado na chama sentida
minha pele em teu corpo, o frio aquecido
teu prazer em min'alma, um sopro de vida!

Nosso algoz foi o tempo cravando o passado
no leito onde Eros transbordava seu leite

Despertando a Psiquê no aparte do amado
jorra o sangue vertendo lembranças tardias
de um ardor trespassado no puro deleite
acordando, d'um sopro, duas almas vadias!

Monica San

19 janeiro, 2010

Sementeira


Tenho buscado em linhas
por vezes rotas e tortas
a sutileza
das verdades universais
a objetividade
das conclusões imprescindíveis
a sobriedade
dos momentos silenciosos
as certezas mais simples
as palavras mais certas
o pouco que alimenta
a alma carente de crenças
Mas hoje, preciso da fartura
da gula que se sobrepõe
da falta que transcende
buscando os excessos
Preciso do grito que mata o silêncio
e fala de uma dor escancarada
de um amor negado, um corpo cansado
Preciso do útero sangrando
pedindo pra se fazer fecundo
e ser vida em contrapartida
desafiando as dores do mundo
E preciso da língua
essa, que extrapola limites
que desvenda sabores
intercalando fendas,
transpondo vertentes
ou fragmentando acidamente
hipocrisias e idolatrias
Preciso dela trazendo à boca
o gosto tácito da febre insana
que me compõe de sabores mórbidos
que me transpõe numa ânsia louca
e faz do corpo só um invólucro
da alma livre que não contenta
do amor que abunda e não se cansa
de semear a palavra viva.

Monica San

04 janeiro, 2010

Presa





















Queria que teus olhos fossem menos pontiagudos. Que não me trespassassem assim, como se minha carne não oferecesse resistência alguma ao teu sal e ao vinagre da tua saliva. Dispões das minhas partes como a preparar o teu banquete, mas limita-se a degustar lentamente como se teu apetite ainda estivesse morno.
Ainda sangro.
Enquanto afias teus caninos em outros ossos, de presas já devoradas, por certo mais saborosas ou mais "ao ponto" que eu.
Ainda sangro.
Enquanto me preparas, a fogo lento, para adornar a tua mesa e fazer parte do teu banquete.
Ainda sangro ao sentir o teu apetite e imaginar a força dos teus dentes, mas agora, meu sangue é a lava que escorre do teu vulcão em chamas, quando me chamas para saciar a tua fome.
Entre teus dentes encontro meu ponto.
E meu sangue escorre, quente, pelos cantos da tua boca.

Monica San

Segredos




São escuros, úmidos
e solitários os porões secretos
por onde escoam
as minhas madrugadas.
Não há sol que os alcance nem
som que rompa o silêncio.
Adormeço ali todos os meus dias,
até que tudo deixe de ser...
e nada mais haja para segredar.

Monica San

Necrológio




Necrológio


Entre lábios
dormentes
um sorriso arrefecia
No silêncio da espera
um beijo,
frio e mudo jazia.

Monica San

Incógnita

Meus olhos se fecham
meus lábios se calam
quando tudo é noite
você amanhece
e incendeia o meu dia

Quem foi que te plantou
na linha do meu horizonte?

Monica San

Amanhece em mim






















É negra e quente
a noite que me recolhe
e abarca o meu cansaço
antes deleite
no calor do teu braço

Enlaça meu sonhos
ao sabor de um beijo
insinuado ao longe
mas tão meu, tão desejo!

É quente e negra a noite
como são negros e quentes
os teus olhos de açoite.

Mas quando a noite se vai
é você quem amanhece
e me faz dia
quente, claro, e feliz.

Monica San

Invento um amor

Abro-te o caminho das pedras
e entre elas escavas
sobrepujando tuas mãos
ao que há de mais interno
inferno das minhas entranhas!

Meus guardados aos poucos
ganhas na ânsia louca
de ser mais invasor e dono
do que convidado
a suprir-me o vão do abandono.

Deixo que te adones dos vãos
e também dos sulcos úmidos
que te sintas em casa
penetrando meus cômodos
e incômodos, pária imundo!

E te reservo,
num intento mais profundo
o prazer do gozo arrancado
na dor do amor inventado.

E me vingo, covardemente
da solidão insistente
e do beijo, que nunca foi dado.

Monica San

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