04 agosto, 2009

Diálogo com a morte





















- Ora, bem sei das sementes fracas que joguei em terras inférteis enquanto tratava de arder meu corpo em leitos de outrém, e provar dos sabores proibidos. Sei dos espinhos que plantei e das pedras que cultivei, até que se voltassem contra mim fazendo-me sangrar com gosto amargo e cheiro de excremento fresco.

Por que então ainda me olhas, quase piedosa, como se não merecesse tuas mãos pesadas e teu beijo fervente que me arrebatem de vez desta vida imunda e fria?

- Como me julgas? Castigo ou alento?

- Castigo, por certo! Acaso não sois o fim de toda uma vida, a expiração do tempo, a sentença do mau pagador?

- Então julgas-te indígna do tempo para que te arrependas do mal e cultives boas sementes?

- Estou cansada. Desperdicei minhas energias em caminhos que não me levaram a lugar algum e ainda deixaram-me os pés carcomidos pela vasta aridez.
Sinto-me um andrajo ambulante.

- Queres descanso? Queres deleitar-se à minha sombra e ainda julgas-me castigo?
Castigo é o que terás, pois sim, mas em vida.
Ainda há muito o que colher, pedras, espinhos e paixões.
Deixa-me (a mim) em paz, alma sem parada!

- Sentencias-me com o sabor amargo da vida, e com a tortura das paixões vazias quando só o que desejo é sentir o corte da tua lâmina?
Bem dizem que és cruel e impiedosa. Veste-se de negro e seduz. Seduziu-me feito uma dama de luxo, mas não passa de ave de mau agouro que se debruça sobre a carniça e espalha a fedentina pelos ares.
És uma praga maldita!

- Pobre alma, inquieta e atormentada. Sabe nada sobre a vida e menos ainda sobre a morte. Dorme infeliz, dorme, mas longe dos sonhos, que eles te fazem ainda pior.

Ô praga! Não é a toa que te chamam poeta.


Monica San

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